É o Orixá maior. Seu nome tem como uma das interpretações a junção de duas palavras: orisá + nla, significando esta última “grande, maior”. Também conhecido, por isso, por Orixalá ou ainda por Obatalá (Obá, rei, senhor; e Alá, pano branco), nome que faria referência ao papel fundamental de Oxalá como Orixá primordial, que na tradição iorubá é representado pelo branco, símbolo da pureza e do divino.
Orixalá, Orixanlá, Oxalá ou Obatalá simboliza um elemento fundamental do começo dos começos, massa de ar e massa de água; um dos elementos que deram origem a novas formas de existência. Os Orixás funfun são os seres que manipulam e têm o domínio sobre a formação dos seres deste mundo – os ara aiyê e também a formação de seres no além.
Os vivos e os mortos, os dois Planos de Existência são controlados pelo Axé de Oxalá. O Alá, o grande pano branco, é o seu emblema. É embaixo do Alá estendido que Ele abriga a vida e a morte. O emblema maior de Oxalá é o Opaxorô (opa do mistério) que Oxalá diferencia o Orun do Aiyê, estabelecendo os dois níveis de existência. Foi ainda com o Opaxorô que Ele furou o Igi-opê (palmeira) e bebeu a sua seiva. Foi esta violação que o deixou sem forças, impotente. O mito diz que foi como se tivesse bebido do seu próprio sangue.
Entre o povo jeje é conhecido por Lissa, em Angola por Lembá, Cassumbecá, Cassulembá, Assulembá, Lembaranganga, Lembadilê e Malemba e para os Cabinda é Gangazumba. Oxalá pode se apresentar como um velho sábio, Oxalufã, ou também como um jovem guerreiro, Oxaguiã, também chamado de Ajagunã. Oxalufã porta sempre seu Opaxorô e junto a Ele, todos os seus filhos se abaixam, porque ninguém pode ser maior que Ele.
O arquétipo dos filhos de Oxalá é a timidez, romantismo, apaixonados e fiéis. São amigos, pacientes, dignos, avesso a fantasia, caseiro, amoroso, lúcido, discreto, desprendido, bom gosto, preciso, tranqüilo, explodindo por vezes, avesso à prática do esporte, sábio, austero, lógico, reservado, lento, inventivo, querendo saber como as coisas funcionam em detalhes, auto-suficiente, avesso à multidão e a luz solar, polido, invulgar, sóbrio, justo, observador, compreensivo, socialista, elevada moral. Gosta de música e de animais.
Representa o princípio masculino fundamental e tem, por isso, sua mitologia sempre relacionada com o princípio feminino fundamental, oposto, chamado Oduduá.
Talvez por isso Oxalá acabe assumindo caráter essencialmente andrógino e pode ser visto, em algumas tradições como uma força feminina. Na Santería cubana, é sincretizado com Nossa Senhora das Mercês demonstrando sua face feminina, possível influência da ideia original de Oduduá e Obatalá como complementos fundamentais. “O branco, representando a criação e o poder genitor, tanto masculino como feminino, parece acentuar ainda mais essa unidade.
Oxalá teria então a função de Criador de nosso sistema, de nosso planeta e de todos os seres que o habitam. Ele moldaria esses seres que receberiam de Olorum o sopro da vida tornando-se, assim, seres vivos. Inúmeros mitos e cânticos apontam essas características de Oxalá e podemos relacionar seu papel com o desempenhado pelo Deus Brahma hindu, o Criador de nosso planeta.
Não confundi-lo com Brahman, o grande Senhor do Cosmo. Equivaleria ao Criador da teosofia, faceta individualizada do Creador, este responsável, assim como Brahman, pelo Todo existente. Não é a toa que tem seu sincretismo também realizado com a figura de Jesus enquanto manifestação de Deus encarnado. Jesus assumiria para os cristãos o papel de Senhor do nosso mundo correspondente à figura de Oxalá.
Fica claro, no entanto, que inúmeros desafios são enfrentados pelos cristãos para fazer sentido a ideia de humanização de Deus enquanto que o conceito do Orixá Oxalá, por mais que possa receber características humanas nos mitos e cânticos, nunca seria confundido com um ser que já encarnou.
Outro exemplo seria o da manifestação dessa força enquanto princípio de manutenção do criado. Aquele que cria tem a função de zelar pelo criado muitas vezes não admitindo mudanças ou resistindo a elas. Como na trindade hindu, Brahma teria a função criadora mas é Vishnu quem mantêm e Shiva quem renova o criado. Oxalá seria o criador zelador e nesse papel teria o nome de Oxalufã (da palavra Ifon, nome da cidade africana com a qual se identifica o culto a esta forma de Oxalá, o Oxalá de Ifon, também chamado, por isso, de Olufon, Oló, senhor, ou seja, o senhor de Ifon), o velho criador.
Nesse papel de Criador pode ainda ser comparado com o deus egípcio Hórus, divindade maior no panteão egípcio representada pela águia, única ave capaz de voar encarando a luz solar de frente, demonstrando sua forte ligação com a divindade, o deus Sol. Ainda outra qualidade de Oxalá o identifica como o artesão que modela as cabeças de todos os seres humanos. Nessa condição receberia o nome de Ajalá, o oleiro divino, conforme nos conta o professor José Flávio: “quem modela os orís (cabeças) é Ajalá… ele é muito velho mas modela no barro com perfeição a cabeça dos homens… mistura no barro um pouco de cada coisa da natureza… se tem mais água a pessoa pode ser de Oxum ou Yemanjá, se é mais terra, de Obaluaiê, depois Olorum dá vida com seu emi (hálito)… São duas as cabeças, uma fica no Orum – terra dos orixás, e a outra vem para o Ayê – terra dos homens. Quando morremos as duas se encontram no Orum com Oxalá…” . Esses são apenas alguns exemplos de como a mesma força pode assumir características múltiplas.
Na Umbanda, Oxalá teria como representação mais característica a personificação da Paz e do Amor. Seria o segundo a ser reverenciado, logo após a energia multiforme de Exu, demonstrando a sua importância em nosso culto. Nada existe acima do Amor, nenhuma meta é mais elevada, nenhum entendimento mais valorizado. Por esse motivo, a única guia necessariamente comum a todos os médiuns é a guia de Oxalá, a primeira a ser confeccionada e sempre a primeira a ser colocada e última a ser retirada, simbolizando que antes de qualquer coisa, o Amor deve estar presente para que qualquer trabalho possa ser realizado corretamente. É através dessa força que entendemos a caridade, exercitamos a compaixão e alcançamos os planos mais elevados da espiritualidade.
Oríkì fún Osàlà
Obanla o rin n’eru ojikutu s’eru
Oríkì para Oxalá
Fonte: Templo Vale do sol e da Lua
Foto: Globo, Flores em Casa, Maria Padilha das Almas.